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Estudo da USP com cérebros humanos vê elo entre uso de álcool e lesões ligadas à demência

Essas alterações são chamadas de arteriolosclerose hialina e se caracterizam pelo endurecimento e espessamento das paredes das arteríolas (pequenos vasos sanguíneos). Esse processo dificulta o fluxo sanguíneo e pode causar danos aos órgãos, incluindo o cérebro, ao longo do tempo

Oito ou mais doses de álcool por semana estão associadas a um maior risco de lesões cerebrais ligadas a problemas de memória e cognição, aponta um novo estudo da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), publicado nesta quarta (9) na revista Neurology, da Academia Americana de Neurologia.

Essas alterações são chamadas de arteriolosclerose hialina e se caracterizam pelo endurecimento e espessamento das paredes das arteríolas (pequenos vasos sanguíneos). Esse processo dificulta o fluxo sanguíneo e pode causar danos aos órgãos, incluindo o cérebro, ao longo do tempo.

Para investigar as lesões, os pesquisadores utilizaram amostras de tecido cerebral do Biobanco para Estudos em Envelhecimento da FMUSP (Gerolab), conhecido como “banco de cérebros”. O biobanco existe desde 2004, tem cerca de 4.000 cérebros guardados e é um dos mais diversos do mundo.

Foram analisados dados de 1.781 pessoas submetidas a autópsias, com idade média de 75 anos ao morrer. Além do tecido cerebral, foram investigados sexo, idade, raça, condições socioeconômicas, doenças prévias, entre outras. Familiares dos mortos também responderam a questionários sobre os hábitos, entre eles o de consumo de álcool.

Com base nas respostas, foram formados quatro grupos: 965 pessoas que nunca beberam, 319 eram bebedores moderados (que consumiam até sete doses por semana), 129 bebedores excessivos (que consumiam oito ou mais doses por semana) e 368 ex-bebedores excessivos.

Os pesquisadores definiram uma dose como 14 g de álcool, o que equivale a cerca de 350 ml de cerveja, 150 ml de vinho ou 45 ml de destilados. Também avaliaram fatores que poderiam influenciar a saúde cerebral, como idade no momento da morte, tabagismo e o nível de atividade física, para evitar vieses nos resultados.

Os bebedores excessivos apresentavam um risco 133% maior de desenvolver lesões cerebrais em comparação com os abstêmios. Entre os ex-bebedores excessivos, o risco de lesões foi 89% maior e, entre os moderados, 60% -em comparação com os abstêmios.

“A gente sugere que até pessoas que usam o álcool de maneira moderada [uma dose por dia] já têm risco maior de desenvolver arteriolosclerose hialina”, diz Alberto Fernando Oliveira Justo, pesquisador de pós-doutorado da FMUSP e primeiro autor do artigo. O estudo, porém, não estabelece uma associação entre
consumo moderado de álcool e habilidades cognitivas.

Os bebedores excessivos e ex-bebedores excessivos tiveram maior probabilidade de desenvolver emaranhados da proteína tau, um biomarcador associado à doença de Alzheimer, com um aumento de 41% e 31%, respectivamente.

O consumo excessivo de álcool no passado também foi associado a uma menor proporção de massa cerebral e piores habilidades cognitivas.

Para o pesquisador, os resultados do estudo reforçam as recomendações da OMS (Organização Mundial da Saúde), no sentido de que não há dose segura para o consumo de álcool. O álcool contribui para mais de 200 doenças e lesões e causa mais de 3 milhões de mortes por ano em todo mundo, segundo a OMS.

“Antes a gente tinha essa ideia de que o álcool moderado era até um pouco benéfico e só o consumo abusivo era super prejudicial. Agora, a gente está vendo que até o baixo consumo pode trazer problemas de saúde”, diz Justo.

Uma das hipóteses que explicam os supostos efeitos protetores de pequenas quantidades de álcool na cognição, encontrados em alguns estudos, são chamados fatores de confusão, como estilo de vida mais saudável e melhor condição socioeconômica.

Na opinião de Justo, compreender os efeitos a longo prazo do álcool na saúde cerebral, especialmente no que diz respeito à memória e às habilidades cognitivas, é fundamental para a conscientização pública e para a implementação de medidas preventivas para reduzir o consumo excessivo da substância.

Os gastos diretos com hospitalizações e procedimentos ambulatoriais para tratar problemas de saúde relacionados ao uso do álcool custam ao SUS (Sistema Único de Saúde) R$ 1,1 bilhão por ano, segundo estudo da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).

No Brasil, o Congresso Nacional analisa uma nova reforma tributária, que entre outras propostas prevê a criação de um imposto seletivo para desestimular o consumo de produtos prejudiciais à saúde, como as bebidas alcoólicas.

O estudo da USP tem algumas limitações. Por exemplo, por falta de dados dos participantes antes da morte, não traz informações sobre a relação entre a duração do consumo de álcool e as capacidades cognitivas.

Também não foi avaliada a presença de deficiências vitamínicas, que são comumente encontradas em indivíduos com consumo excessivo de álcool.

Fonte: Notícias ao Minuto

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